Canto a vida e insisto
Porque viver me alegra
Canto a morte e resisto :
Cada extremo se integra
Canto a luz que há de vir
Iluminar os meus passos
Canto à sombra que a seguir
Lhe mostrará lados baços
Canto a tudo e canto a nada
Haja música no espaço
Do ar leve caia a espada
Voltemos para o regaço!
2024-06-14
Décimas populares
Da força e da fragilidade:
Mote:
Amar a paz e a guerra
Pulsando em guerra e paz
Vive o homem nesta terra
Com o mal e o bem que faz...
Somos todos tão, tão, frágeis
De vidro, de tela fina
Sem saber a nossa sina
Pesados, caindo ágeis
De asas inexoráveis
No cimo de uma quimera
Voando do céu p'ra Terra
Quando o castigo apraz
Quantas vezes satisfaz
Amar a paz e a guerra?
Onde está a tua magia?
Lua que terás os mares
Das marés que navegares
Cheia, redonda, macia
Tão forte se evidencia
Essa corrente que dás
Rega, da água que traz...
Mas o coração só treme
Nem sempre agarra o leme
Pulsando em guerra e paz
Verdes ficam estes campos
Regados do teu olhar
Um mundo a abrolhar
Doces vão os figos lampos
Luzentes os pirilampos
Na planície ou na serra
É a vida que próspera
Dizendo a toda a gente:
De cuidar bem da semente
Vive o homem nesta terra!
Somos todos tão, tão, fortes
Aguentando o que é vil
De homens de triste perfil
No meio de tantos desnortes
Entre vidas, entre mortes
O que nos tornou assim?
A eles, como a mim?
A competição sem tréguas?
Procurar nas sete Léguas?
Com o mal e o bem que faz...
2023-10-28
Apenas um pouco mais
De tempo
As palavras uma a uma
Poderiam me exprimir
Saco-as por entre a bruma
Mas não querem emergir
Tirá-las do esconderijo
É trazer-me sentimento
Nada mais de mim exijo
Que abrir o peito ao vento
Tenho vida tenho morte
Tenho um circo de guerra
Ando no fio da sorte
Ou na lâmina da fera
Somos todos encobertos
Senda de Sebastião
A caminho de desertos
Ou de qualquer rendição
Entre brumas, vento e terra
A pedra fica coesa
Âmago de átomo à espera
Da eterna chama acesa
O escultor tem a paixão
Torna tudo diferente
Importa o coração
Aprender a fazer frente
Palavras a burilar
A escultura que sou eu
Entre o sol a raiar
E a escuridão de breu
Nova árvore já nasceu...
2023-12-12
Na canção busquei a força
Enleei o coração
Passo a passo que se torça
Rodopiando em pião
Na força busquei o canto
Em cada canto de mim
Foi grito nascido santo
Ou selvagem, donde vim
No canto busquei ser forte
Para tocar com paixão
Ou cantar a minha sorte
Aos levantados do chão!
Busco força e canção...
Vibro em cada nervo tenso?
Ou liberto a tensão
Vogando um amar imenso?
2024-06-16
Fio e linha de oito quadras versus, 8 in-finito
Mais um dia que começa
Tento alinhar o cabelo
Entrançando uma promessa
Desenrolando o novelo
Fio-me nas encruzilhadas
Dos caminhos retraçados
Perco os fios às meadas
No horizonte encontrados
A linha com que me coso
Bordei-a em ponto cruz
Num tapete onde repouso
Ou voo em busca de luz
Busco tecer perfeição
Em cada linha que escrevo
Ouso a reinvenção
E amo o antigo acervo
As múltiplas línguas mortas
Pode alguém tê-las escrito
Direito por linhas tortas
Pertencem ao infinito
Sigo o fio dos pensamentos
Uns vão no fio da navalha
Outros em fios de água, bentos
Ligados na mesma malha
Todos em linha de conta
Ou todos desnecessários
Enfio na agulha a ponta
Do fio de longos rosários
Mais um dia que termina
Seguem-se dias a fio
Reinvento o fim da linha
Do destino em que confio
2024-08-26
Oriente quase haiku
O Oriente, enfim!!!
Onde todo o céu nasce
E a lua dá-se...
Orientei-me lá
Onde há um horizonte
Fui direita à fonte
Sou fundo de mim
Sou vida onde há morte
Vou atrás da sorte!
Ergui-me ou caí?
Na verdade não se sabe
No todo se cabe...
2024-03-19
Caos
Deambulo pela rua
Cheia de sonhos alheios
Para esta rua ser tua
Muralhas feriram seios
São sonhos de calceteiro
Pedra bem aparelhada
Para ganhar o dinheiro
Onde a vida é calcada
São sonhos que um pedreiro
Fez levantar as paredes
De prumo sempre certeiro
Sem saciar outras sedes
São sonhos de engenheiros
Em busca de precisão
Arquitectos, jardineiros
Por nome, belo, função
Sonhos de toda a gente
Que a rua imaginou
Olho vê, coração sente
Com mãos a concretizou
Sonhos postos em camadas
Sucessivas gerações
São construções quer amadas
Quer cobertas de razões
Pedras, árvores e tijolos
Metais, madeira e terra
Para os homens foram colos
Ou argumentos de guerra
São sonhos e pesadelos
Prontos a desmoronar
Tempo desfaz os novelos
Da rainha a destronar!
Tudo a acabar no caos
Grande caos dos diabos maus
Naufragaram lá as naus
Delas espalharam-se os paus
CAOS betão de ar baço
DO CAOS EU RENASÇO,
PASSO!!!...
A passo...
Deambulo pela rua
Cheia de um sonho futuro
Vou de cabeça na lua
Caminho suave e duro!
2024-07-28
Amor aos quatro elementos
Amo-te deserto de mim onde te busco!
Longínquo ponto a inalcançar
E eu, no lusco-fusco
A traçar...
Risco!
Desenhei-te rente ao mar
Para se apagar o traço
Dum certo modo de amar
Onde falte o teu abraço
Desenhei-te na montanha
Entre penhascos escarpados
Para o que se despenha
Traçar a sorte aos fados
Desenhei-te ar de vento
Nave ainda por lançar
Para o olhar voar lento
Traçando um alcançar
Desenhei-te fogo ardente
Traço a qualquer elemento
Para eu, fénix urgente
Vir renascer dum fragmento...
Risquei
Arrisquei!
Foi por Amor que ardi
Fui ao âmago do sentimento
Amo-te deserto de ti onde te perdi!
Que se ajeite!
Reencontrei... o momento
Desenhei-te...
2024-09-19
Venho do fundo dos tempos
Onde não há bem nem mal
A somar escolhas e ventos
Tornei-me, eu, desigual
Há males que vêm por bem
Há bens que vêm por mal
A eternidade tem
Sempre de dar o aval?
O que aflora desta espuma
Dança do tempo e do espaço?
Serei várias ou só uma
Conquistada passo a passo?
Queria ser árvore grande
Fugir da loucura humana
Erguer drupa, baga ou glande
Onde o cheiro a terra emana
Mas se em épocas remotas
Se pagava com a vida
Não tocar as mesmas notas
Que a divindade temida
Também quero ser quem sou
Libertando-me de enleios
Sentir bem o que alcançou
Quem ousou quebrar os freios
Vou para o fundo dos tempos
Onde não há mal nem bem
Semear escolhas e ventos
Junto o teu amor também!
2022-07-21
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